Drops para o fim de semana::Blindados: a boa idéia desprezada pelos criadores::

Vou deixar o Rafale, o Mirage 2000-9 um pouco pra lá. Isto porque descobri, meio por acaso, algumas pesquisas que fiz anos atrás. Algumas não valem nada, outras podem render alguma coisa. Entre estas últimas, está o texto que resolvi submeter ao rigoroso escrutínio dos assíduos de causa:: Trata-se de um ensaio sobre as origens da arma blindada, tema que sempre me atraiu. De certa maneira, o tema guarda certa semelhança com o que tem sido discutido aqui, ultimamente: a estupidez em torno de questões militares não é apanágio dos políticos brasileiros – pode grassar até mesmo entre os militares::

O fim da Grande Guerra apontou, para todos os envolvidos, no Velho Continente, um tempo de dificuldades. Os quase cinco anos de guerra exauriram as economias dos principais envolvidos, além da enorme perda de vidas humanas. A guerra provocou um total de mais de 30 milhões de baixas, dentre as quais uns treze milhões de mortos, entre militares e civis. Um problema adicional foi os milhões de incapacitados permanentes que, no auge de suas vidas produtivas, passaram a ter de ser sustentados pelo Estado. Num cômputo geral, as economias européias recuaram aos níveis de 1913, embora Estados Unidos e outras regiões do mundo, como a Austrália, Canadá e Argentina, tivessem sido grandemente favorecidas pelas demandas criadas pela guerra.

A produção de armamentos, não é preciso dizer, cresceu exponencialmente, no período. A adaptação das indústrias e novos métodos de organização industrial – estes já vinham sendo experimentados desde o século anterior – mostraram-se muito bem sucedidos, e o resultado é que todas as nações acabaram a guerra com quantidades de armas muito além de suas necessidades para um futuro imediato. É natural, então, que a combinação entre dificuldade econômica e excesso de oferta de armas tenha restringido o aparecimento de novos tipos e, principalmente, de pedidos novos pelos governos. Isso só iria voltar a acontecer lá pelos meados da década dos 20, e, mesmo assim, de forma muito tímida. A partir do momento em que cessaram as hostilidades, as potências vencedoras trataram de desmobilizar seus gigantescos exércitos. Isso tinha de ser feito com alguma presteza visto que os governos vencedores, com exceção dos EUA, encontravam-se profundamente endividados. Assim, não é de surpreender que os projetos novos, na Grã-Bretanha, França e até dos EUA, tenham estagnado.

A Grã-Bretanha, que tinha acabado a guerra com 25 batalhões de tanques formados, rapidamente desmantelou a maioria dessas unidades, de modo que, pelo início de 1921, restavam cinco batalhões, além de algumas unidades de “carros blindados”, usadas principalmente no além-mar. É interessante observar que o supremo comandante militar britânico, Sua Majestade Jorge V, manifestou certa simpatia pela arma blindada, ao atribuir, em 1923, o título de “Real” ao Corpo de Tanques. O que não significou mais do que uma honraria simbólica, pois, aquela altura, o Gabinete Militar não parecia nada simpático aos blindados.

Por outro lado, os blindados tornaram-se uma verdadeira moda, entre militares do mundo inteiro, tanto em países que estiveram envolvidos no conflito, quanto naqueles que o tivessem apenas observado. Os “apóstolos da arma blindada” também surgiram em grande quantidade. Entretanto eram, em geral, oficiais de escalão intermediário, que pouca ou nenhuma capacidade de influência tinham sobre as instituições militares de seus países. Foi exatamente o caso do coronel (depois general) Sir John Fuller. Envolvido com o planejamento e treinamento dos oficiais de Estado-maior da Força Expedicionária Britânica, Fuller esteve sempre muito interessado nos meios mecânicos na guerra moderna. Embora visse os tanques, inicialmente, com certa desconfiança, ele acabou percebendo, por volta de 1916, que o problema não estava na arma, mas no emprego que era feito dela. Passou a afirmar que seu uso deveria ser feito apenas onde o terreno e as condições táticas se mostrassem perfeitamente apropriados. Fuller idealizou, por volta de meados de 1918, um complicado e multifacetado projeto para uma ofensiva blindada de grandes proporções, que deveria resultar em diversos pontos de penetração nas defesas alemãs. Atuando em velocidade, as pontas-de-lança blindadas produziriam o colapso nas linhas de comunicação e suprimentos que atravessavam a retaguarda inimiga, provocando a desagregação da estrutura de comando alemã. A idéia – bastante original – era atacar os alemães rápida e decisivamente, desarticulando sua infraestrutura militar – quartéis-generais, organização de apoio e logística – antes que pudessem se reorganizar e seguir combatendo. Mas, por outro lado, o projeto de Fuller envolvia diversos problemas, inclusive o fato de ter sido engendrado prevendo a utilização de modelos de tanque que, naquele momento, ainda estavam em fase de projeto, os “Médio C”, um modelo bastante convencional,  e “Médio D”, que poderia ter sido um veículo revolucionário. Projetado por um oficial do Real Corpo de Engenheiros, pesava cerca de 19 toneladas, tinha uma capacidade de cruzar trincheiras maior do que a dos tanques pesados, era extremamente manobrável graças à uma motorização até então não proposta para carros daquele tamanho e chegava a atingir, em terreno plano ou estrada, 33 km/h. Embora o armamento proposto fossem três metralhadoras Hotchkiss, uma versão “macho”, com um canhão de seis libras de cano encurtado chegou a ser ventilada. Mas o “D” apresentou problemas durante o projeto, devido a inovações mecânicas mal dimensionadas (como o sistema de esteiras e a suspensão), que acabaram por atrasar o surgimento de um protótipo. Fuller ficou muito impressionado com a concepção do veículo, e ainda tentou influenciar para que a etapa de produção fosse acelerada, mas aquela altura, o comando do exército resolveu bater o martelo pelo “Médio C”, que tinha mais chances de estar disponível na primavera de 1919. O fim da guerra e as dificuldades financeiras exterminaram com ambos.

Já o plano de Fuller, foi exterminado bem antes: desenvolvido e apresentado, em meados de 1918, ao comandante-em-chefe britânico sir Douglas Haig e ao comandante das tropas aliadas, o marechal francês Foch, com o nome de “Plano 1919”, o projeto resultou imediatamente em forte controvérsia. Haig chegou a caracteriza-lo como “lixo teórico”, no que foi seguido, com maior ou menor veemência, por diversos comandantes britânicos. Poucos foram favoráveis, e, ainda assim, com reservas. Curiosamente, os franceses encararam o “Plano 1919” com simpatia. De qualquer forma, a guerra acabou antes que se pudesse ter chegado a alguma conclusão, mas Fuller ficou profundamente decepcionado com o pouco interesse suscitado por seu projeto. Após a guerra, o então coronel – depois general – continuou envolvido com o pensamento doutrinário das nascentes forças blindadas britânicas, o que acabou por torna-lo profundamente desanimado com a atitude reinante no exército britânico em torno do uso dos blindados.

Os franceses também tinham seus entusiastas de tanques, mas numa direção diferente. O grande pensador francês dos blindados, durante a guerra, foi o tenente-coronel Jean Baptiste Eugene Estienne, originalmente um artilheiro com formação em engenharia. Este oficial fortemente intelectualizado (publicou artigos sobre matemática na Academia Francesa das Ciências e ministrou aulas na escola de estado maior, onde teorizou sobre o emprego de fogos indiretos) no início da guerra estava interessado em prover proteção para a artilharia, e acabou se envolvendo com o projeto do pequeno  Renault FT17.

Embora Estienne tivesse sido um dos apoiadores da opção francesa por tanques leves, não foi responsável por ela. Essa foi determinada, em grande medida, pela escassez de materiais, que já começava a ser sentida em 1916. Daí o sucesso do FT (Faible Tonnage, algo como “pouco peso”), produto barato cuja produção era simples, mas que  também apresentava problemas quanto ao emprego: não era propriamente um “rompedor”, capaz de abrir brechas na linha adversária – paepl que acabava mesmo reservado às formações de infantaria. Ainda assim, a superioridade do FT diante dos outros modelos disponíveis para os francese consolidou a opção doutrinária pela dispersão dos carros em meio às formações de infantaria. Essa opção iria provocar intensos debates após a guerra.

A idéia do tanque leve lançada pelos franceses acabou fazendo da França o maior produtor de blindados da guerra. Este dado é fundamental, pois, terminado o conflito, tendo um estoque de mais de 2500 unidades, a França tornou-se o principal fornecedor de tanques do mundo, e a maioria dos países menores adquiriu seus primeiros blindados direto dos estoques franceses. Por sinal, os primeiros blindados em serviço no Exército Brasileiro foram doze FT17, entregues em 1921. O FT17 se difundiu de tal maneira que, por incrível que pareça, no final dos anos 80 ainda podiam ser encontrados “na ativa”. Basta dizer que haviam pelo menos cem deles distribuídos às tropas alemãs na Normandia, em 6 de junho de 1944.

Quanto aos norte-americanos, a quarta das grandes potências industriais envolvidas na guerra, sua intervenção no conflito e atitude diante da nova arma merece alguns comentários mais atentos. A decisão dos EUA em intervir diretamente na guerra, com o envio de tropas ao teatro europeu, coincidiu com o impasse estratégico aberto pela retirada da Rússia, em 1917. Mas suas forças eram, no início do ano de 1918, bastante pequenas, e isso não mudaria até o mês de agosto seguinte, quando, finalmente, o fluxo de tropas americanas alcançou um nível que passou a faze-las pesar na balança estratégica. Ainda assim, os soldados dos Estados Unidos estavam equipados com uma miscelânea de armamento europeu – francês e britânico – cedido ou fabricado sob licença: canhões 75 mm TR franceses, tanques Modelo IV e V, britânicos, tanques leves Renault, aviões franceses e ingleses. De fato, a enorme potência industrial americana já fabricava, em 1916, enormes quantidades de armamento leve, munições e outros bens necessários ao esforço de guerra europeu, mas levaria tempo até que esse potencial econômico se traduzisse em eficiência militar. Quanto à organização e as doutrinas, os americanos seguiam ingleses e franceses, e as escolas de treinamento da Força Expedicionária Americana não diferiam e nem faziam nada diferente das que tinham sido tomadas como modelo. Assim, ao fim da guerra, os EUA tinham uma espécie de emulação do Real Corpo de Tanques britânico, e regimentos de carros de combate copiados do modelo francês que, inclusive, serviu de base para a implantação, na França, da primeira escola de tanques do Exército dos EUA. Depois da guerra, os norte-americanos também seguiram os europeus: a rápida desmobilização do milhão e meio de homens enviados às frentes de combate deixou sem uso enorme quantidade de itens militares. O estudo das doutrinas inglesa e francesa, sobre o uso de veículos à motor entrou numa espécie de “banho-maria”, desde que, em 1920, foi determinado que o uso de blindados fosse colocado a reboque das táticas de infantaria. Alguns dos modelos projetados desde então eram curiosamente semelhantes ao FT francês, com grande ênfase colocada na velocidade e na manobrabilidade.

A idéia, entretanto, continuou avançando, pelo menos no que diz respeito à teoria. Além de Fuller, um dos mais entusiasmados defensores do uso de tanques era o capitão Basil Liddell-Hart, cujas teorias envolviam o uso de ataques coordenados de grandes grupos de tanques, como forma de paralisar o inimigo. Liddell-Hart foi talvez o mais prolífico analista e escritor militar britânico do século 20. Suas principais formulações teóricas, sobre estratégia, tática e doutrina militar surgiram entre 1925 e 1939, período em que se dedicou ao jornalismo e à atividades de pesquisa acadêmica. Por volta de 1940, fez publicar um volume em que, baseado num monumental estudo de história, defendia a “abordagem indireta da estratégia”, uma forma de, através da ação periférica, desgastar o adversário nas áreas em que fosse mais vulnerável, de forma a poupar os próprios recursos, principalmente os militares.

Os escritos de Liddell-Hart eram conceituais, baseados em amplo e erudito conhecimento da teoria e história militar, e tiveram forte influência sobre a oficialidade combatente. Embora tenha dado baixa do exército em 1924, por invalidez, continuou a ser um influente pensador militar e defensor entusiasmado das forças blindadas. Falava na aplicação, por forças mecanizadas sob comando unificado, de golpes decisivos, em série, contra um mesmo ponto, de preferência o mais próximo possível das posições centrais do inimigo. Essas forças deveriam ser compostas por blindados, infantaria motorizada, de preferência transportada em veículos protegidos, e aviões. Liddell-Hart chegava mesmo a afirmar que os tanques poderiam restaurar, no século 20, a idéia mongol de mobilidade extrema – a cavalaria mongol fora o principal instrumento de conquista desse povo asiático. Sobretudo, pensava que a mobilidade poderia evitar a repetição futura dos massacres da guerra de trincheiras.

No Alto Comando, a coisa foi diferente – o descaso e mesmo a zombaria em torno de Liddell-Hart e suas idéias eram constantes. Segundo alguns de seus colegas, seriam idéias típicas de um oficial sem “aptidões esportivas” (a carreira militar dele tinha praticamente acabado, em 1918, devido a ferimentos provocados por gás). Ainda assim, quando testadas em campo, se mostravam bastante eficientes. Entre os generais, a tendência era achar que o tanque não teria como enfrentar canhões anti-tanque de grosso calibre, bem posicionados e operados. Essa era, com efeito, a idéia do Mestre-Artilheiro da Real Artilharia, general Hugh Elles, entusiasticamente esposada pelos principais oficiais-generais britânicos. Seguindo sua experiência de campanha, Elles estava seguro de que um canhão anti-tanque bem posicionado poderia pôr fora de combate qualquer tipo de tanque, e, com base nisso, era contra aumentar a blindagem dos veículos. Essa idéia teria consequências de longo prazo, pois os britânicos, pressionados por dificuldades econômicas, investiram em veículos leves, em torno de armamentos de calibre relativamente baixo.

A forte propaganda de Liddell-Hart em favor da mobilidade e do “princípio mongol” continuou, entretanto, com energia crescente. Mesmo fora do exército, o ex-capitão já era visto como o principal pensador militar da Grã-Bretanha. A pressão dos entusiastas dos blindados teve algum resultado em 1927, quando o Alto-Comando determinou a formação da “Força Mecanizada Experimental”. Tratava-se essa de uma pequena tropa, dotada de 120 veículos, dos quais apenas meia centena eram tanques médios Vickers, o “Médio Modelo II”. Desenhado a partir de um requerimento feito pelo exército no início dos anos 1920, foi a primeira máquina desenhada após a guerra, e guardava certa continuidade com os “tanques de cavalaria” projetados durante a guerra, os Whippet. Pesando cerca de 12 toneladas, chegava a alcançar 25 km/h, protegido por uma blindagem máxima de 12 mm. Era armado com um canhão de 3 libras (47 mm) e três metralhadoras .303, sendo que uma delas era coaxial e as outras estavam instaladas nas laterais do casco. A tripulação era composta por cinco homens.  Apesar de suas limitações, quando lançada em manobras, a FME se demonstrava muito superior as unidades organizadas de forma clássica. Ainda assim, essa unidade revolucionária teve vida curta, sendo dissolvida depois de uma bem-sucedida manobra realizada em 1928, na planície de Salisbury. É notável que tenha atraído mais a atenção de observadores estrangeiros que dos próprios britânicos: norte-americanos e alemães ficaram bastante impressionados com os resultados da FME. Os primeiros constituíram uma força similar e os últimos traduziram e divulgaram amplamente algumas publicações que descreviam a unidade inglesa.

Entretanto, ainda que os exercícios indicassem o contrário, os tanques não eram vistos como uma arma capaz de, sozinha, abrir brechas nas linhas inimigas, infringindo-lhes danos de proporções consideráveis. A hierarquia militar britânica decididamente preferia usar, em tal função, unidades de cavalaria ou “infantaria de Guardas”, no velho estilo. Muitos dos que não viam a nova arma como digna de atenção, ainda em 1928 argumentavam que, apesar dos sucessos de 1918, elementos fortemente dependentes de máquinas não eram suficientemente confiáveis em situação de combate. Muitos dos que debateram e escreveram sobre o tema, no período entreguerras, também levantavam o argumento do custo dos tanques: os cavalos eram mais baratos e confiáveis – além de muito mais atraentes em paradas::

O rafalista juramentado examina os concorrentes::Um olhar interrogativo para um possível “caça possível”::

Eu, rafalista juramentado e militante, continuo isolado em uma deliciosa cidade da região do Alto Paranaíba, Minas Gerais, onde, além de longas caminhadas e corridas de fim de tarde, pouco mais há o que fazer. Situação que me leva a pensar que estamos a menos de 500 quilômetros de Brasília, capital federal, e que, provavelmente, parte das futuras aeronaves brasileiras ficará estacionada na base de Anápolis, sede do 1º Grupo de Defesa Aérea, atual sede dos 12 Mirage 2000C que, atualmente compõem o principal elemento de combate da FAB. Por agora, fico imaginando se não poderei ver um elemento de “Jaguares” aparecer nos céus do Triângulo Mineiro, em treinamento.

Possivelmente, não, e os motivos são muitos. Como não é o caso de aprofundá-los aqui, fiquemos com apenas um: os Mirage 2000C, que atualmene constituem o equipamento do GDA, certamente não voam tanto quanto deveriam, por motivos meramente econômicos.

A aquisição dos F2000 foi, em 2005, e desde então, tem sido, alvo de muitas críticas, por parte de especialistas, assim como tem sido dada como uma solução “razoável”, para uma situação de emergência. Críticas e apoios meio que se contrabalançam. Do lado das críticas, as principais os mostram como aeronaves caras e de manutenção problemática.  E, para piorar a situação, os F2000 (como são refernciados, na FAB) em operação no 1° GDA foram fabricados nos anos 1980, e estavam estocados, na Armée de l´Air, quando adquiridos, em 2005, o que quer dizer que já estavam, então, aproximando-se do final de suas vidas úteis. Sobre até quando se estenderá essa vida útil, não existem informações conclusivasmas a própria FAB tende a achar que não vale à pena estender os contratos feitos com o governo francês até depois do prazo estabelecido, que é dezembro de 2013. Quanto aos elogios, embora não se possa negar que os Mirage 2000 C são, de fato, aeronaves, atualmente, de segunda linha, alguns especialistas dizem que foi a melhor opção colocada à FAB. Aeronave monoturbina, o F2000 é fabricado utilizando muitos materiais compostos, o que ocasiona uma notável diminuição tanto na assinatura de radar quanto no peso da aeronave: vazio pesa apenas 7400 kg, ou seja pouco mais que os antigos F103. Por isso, o seu propulsor, o turbofan Snecma M53-5, com potência de 54 kN e 86,3 kN em pós-combustão, empurra o conjunto à velocidades de até Mach 2.2 (por volta de 2400 km/h), numa altitude de até 70000 ft. Em baixa altitude e sem utilizar pós-combustão, a velocidade chega a Mach 0.9 ( pouco menos de 1100 km/h). Sua  autonomia máxima é de 3500 km, alcance que pode ser estendido pelo uso de tanques externos ou recurso a reabastecimento em vôo. O Mirage 2000C pode decolar com carga máxima de armas usando menos de 1200 metros de pista pavimentada. Os aviônicos são adequados, assim como o armamento. Estão equipados com o radar Dassault Electronique/Thomson-CSF RDI série J2 (Radar Doppler à Impulsions, “radar Doppler a impulsos”) com um alcance de aproximadamente 100 km, capacidades de processamento digital de pulsos e look-down/shoot-down, controlando mísseis Matra Super-530D tipo longo alcance, de guiamento semi-ativo, e “buscadores de calor” Magic. Outros parangolés dessa aeronave incluem controles fly-by-wire, sistema de navegação inercial (INS) Sagem ULISS 52, rádio altímetro e diversos computadores de bordo, centrados no Dassault Electronique 2084. Ou seja, não é uma sucata assim tão sucata. Por outro lado, não estão previstos upgrades e muito menos MLU (mid life upddate, “modernização de meia vida”) em função da idade das células. Isso implica em dois problemas, já previstos pela FAB na época da aquisição. Embora o míssil Super 530D fosse considerado pela força um degrau acima, chegou a ser considerado o MBDA “Mica”. Entretanto, qualquer alteração no armamento implicaria em modificações no computador central e no barramento correspondente, providências bastante dispendiosas e que talvez não fossem autorizadas pelos franceses. O mesmo problema seria a integração de armas nacionais, como o míssil CTA/Mectron MAA-1 Piranha e o então em projeto MAA1B. O segundo problema é a ausência de enlace de dados (datalink) o que impede o F2000 de atuar em conjunto com os R99A do esquadrão “Guardião”, que são, atualmente, a grande vantagem da FAB em relação a nossos vizinhos sul americanos: a capacidade plena e já testada de atuar em ambiente de rede (vale á pena ler este interessante relato divulgado pelo ótimo portal Defesa BR).

Esse fato coloca um problema mais amplo: as notáveis mudanças tecnológicas e doutrinárias por que passa o campo de batalha nos apontam duas questões: é impossível não considerar a dominância da dimensão aérea dos teatros de baixa intensidade – vide o exemplo recente da Líbia (um) e, (dois), a estrutura orgânica das atuais forças aéreas deverá mudar notavelmente nos próximos vinte anos. Tem gente dizendo que as aeronaves de quinta geração que estão entrando em serviço – F22 Raptor, F35 Lighting II, Sukhoi T50 – serão as últimas aeronaves de combate tripuladas a ver os céus. Tem gente que também não acredita nisso. Os VANTs têm sido usados intensamente em alguns teatros, e os principais formuladores não tem manifestado muito entusiasmo com os resultados obtidos; alguns tem dito que ainda demora muito tempo até que se consiga um que possa ter o mesmo desempenho de uma aeronave tripulada, em função da “consciência situacional”, resultado, em grande parte, da integração entre homem e máquina.

Por outro lado, o preço das aeronaves de última geração, sejam elas da “quatro e meio” ou da “quinta”, se tornaram astronômicos, tanto no que diz respeito à aquisição quanto à manutenção. Talvez com exceção da indústria químico-farmacêutica, não existe outro ramo da produção que integre tanta tecnologia “estado da arte” quanto a indústria aeroespacial. No ramo militar, nem se fala: a superioridade passou a depender estreitamente desse aporte de tecnologia. Visto que forças armadas são setores improdutivos do aparato dos Estados, vale à pena empenhar bilhões de dólares em tal tipo de aquisição? É a grande dúvida que assola todas as nações de primeira linha, hoje em dia. E, principalmente, vale à pena fazer tais inversões sem a absoluta certeza de que se está fazendo a melhor aquisição possível?

Não. Na confusão de idas e vindas em que se tornou o a concorrência FX2, é a única conclusão razoável que ser pode tirar dela. Algumas autoridades e especialistas tem dito que talvez seja o caso de esperar mais um pouco. Tudo bem – talvez faça sentido. Se contarmos o programa FX, já se vão dezoito anos. Todo o panorama tecnológico e doutrinário mudou de tal maneira que, quase certamente, dentro de uns dez anos, todas as aeronaves relacionadas na concorrência estarão obsolescentes.

Não que isso seja novidade para a FAB: em toda a sua história, talvez em duas oportunidades a corporação tenha estado equipada com equipamento atualizado: o final da Segunda Guerra Mundial e o início dos anos 1970, com a aquisição dos Mirage III EBR, F5E e AT26. Esse inventário não caracterizava uma “primeira linha”, mas permitiu um salto tecnológico de considerável monta: aeronaves supersônicas, sistemas de radar embarcados, mísseis de guiagem ativa, mísseis buscadores de calor, e por aí vai. Não era pouca coisa; deixou de ser muito rapidamente, e, em meados da década seguinte, o equipamento novamente se tornava obsolescente. Em meados dos anos 1990, a situação era pouco menos que desesperadora. Foi essa situação, e a indefinição do programa FX – que, posteriormente, acabou sendo descontinuado, que levou tanto à aquisição do Mirage 2000C quanto ao programa de modernização dos Tiger II, que se tornaram o “F5EMBR”.

Essa situação tornaria urgente o estabelecimento do modelo a ser adquirido pela FAB. Só que o problema continua o mesmo de 15 anos atrás: o poder executivo da “quinta economia do mundo” não se mostra nem um pouco disposto a gastar uns dez bilhões de dólares comprando aeronaves “top de linha”. O pacote incluirá, se e quando, acontecer, não apenas as aeronaves, mas também o armamento, que certamente será o mais avançado disponível no mercado – e o mercado deve estar desesperado atrás de compradores.

Ultimamente, surgiu uma notícia curiosa. Provavelmente é apenas mais uma, dentre a profusão de informações sem pé nem cabeça que se desdobram da forma com que o Executivo administra o FX2. O Brasil teria se tornado cliente potencial para 60 Mirage 2000-9 (versão de exportação do 2000-5, usado pela Armée de l´Air) pertencentes à Força Aérea dos Emirados Árabes Unidos. A notícia não é nova, e tem circulado, de tempos em tempos, desde 2010, quando o então ministro da Defesa, o boquirroto Nélson, visitou os EAU. Em princípio, talvez não fosse má ideia: os 2000-9 são uma versão bem mais atualizada dos 2000C. São equipados com o radar RDY, enlaçamento de dados (datalink) e capaz de operar mísseis BVR. Entretanto, os Mirage 2000 têm mostrado um problema difícil de superar – o alto custo da hora de vôo, avaliado em algo por volta de US$ 24.000,00. Este seria o grande “senão” à aquisição dessas aeronaves, seja de que versão forem. O blog “Poder Aéreo”, recentemente, publicou um interessante artigo sobre o assunto: a questão é que parece que as autoridades tem considerado a possibilidade de adquirir um grande lote de aeronaves usadas, além de novos Mirage 2000. Segundo o artigo … Os caças finalistas do FX2 são caças de quarta geração, enquanto os outros BRIC já estão desenvolvendo seus caças de quinta geração. O Brasil quando se decidir por um novo caça, fará uma compra de ‘timing’ comparável à da aquisição do Gloster Meteor na década de 1950, o primeiro jato da FAB, que foi adquirido quando já era obsoleto. Para quem não sabe, o ano era 1952. A FAB aspirava os jatos North American F86 Sabre, acabou levando o Meteor F8, um projeto inglês da segunda Guerra Mundial, da mesma época do Me262 e bastante inferior a este.

Trata-se de um ponto a considerar. Concordo totalmente com o especialista Alexandre Galante, redator da matéria: talvez a época do FX2, ou de qualquer FX, tenha passado. Mas como ficará a situação daqui para diante? Não será o tempo de pensar num projeto autóctone? Ou em participar, de alguma forma, de um projeto já existente – no caso, teria de ser o T50, o único que estaria, teoricamente, aberto, embora o Brasil, convidado a participar do projeto, não tenha chegado a se manifestar. Bem, como diz a sabedoria popular, o futuro a Deus pertence::

Um debate sobre o Rafale entre dois rafalistas::

Tive a grata surpresa de encontrar, na área de comentários da última postagem sobre o Rafale, o longo comentário do leitor (espero que assíduo…) Francisco AMX. O Francisco reclamava de minha parcialidade em torno do Eurofighter Typhoon, e resolveu assumir a defesa do Rafale. Mas o comentário é de tal forma consistente que resolvi transferir tudo da área de comentários para a área principal, como uma espécie de “contrapostagem”. Ao longo do ótimo texto do cara, que parece entender do assunto e estar atualizado, farei algumas observações para esclarecer minha posição. De cara, posso dizer que, ao contrário do que entendeu o Francisco, sou rafalista, e não tímido. O problema é que o texto foi editado a partir de uma fonte indicada, e o autor, este sim, parece adepto do Typhoon. De toda maneira, agradeço pela intervenção, e gostaria de contar sempre com comentários desse naipe::

Eu até ia comentar num “sentido” imparcial, mas percebi, sem muita dificuldade, que sua “análise” final ficou afetada, nota-se isso pela maior exposição de argumentos pró-tufão… Levemente, mas ficou (e o engraçado é que você se diz um torcedor/defensor do Rafale, caberia ao amigo contestar não acha? Ou não conseguiu?) [nota de causa:: sou “rafalista” do radomo ao exaustor do propulsor. Mas, como estava escrito lá, o texto é uma tradução editada a partir de uma fonte, que estava indicada. O autor do original, comentando o MMCRA indiano, é que parece ser typhoonista] Falam em agilidade superior do Typhoon, mas o que o mundo presencia, constantemente, são os “prêmios” de melhor apresentação nas últimas grandes feiras de aviação internacional, e em baixas velocidades!!! Seria mérito apenas do piloto? [nota de causa:: sobre a agilidade superior do Typhoon, é o único aspecto em que, acho, essa aeronave pontuaria. Digo isso pela posição dos canards, coisa que está bem colocada no texto. Os do Typhoon foram projetados para implementar a manobrabilidade da aeronave, o que caracterizaria uma aeronave de superioridade aérea, enquanto os do Rafale fornecem sustentação adicional (o tal do “arrasto erodinâmico”), o que implementa a carga alar e, por consequência, a estabilidade, mas não a agilidade. Segundo a documentação a que tive acesso, esses aspectos de uma e de outra aeronaves, foram comprovados em túnel de vento] Sobre o radar… Ora, o RBE2 AESA já está integrado, fará parte dos novos lotes F3 do Rafale a partir de 2012-2013. O radar CAESAR, pelo que se tem notícia recente, apenas engatinha, e com a crise, você realmente acha que estará pronto e integrado em 2014? Sou capaz de afirmar que não fica pronto em menos de 7 anos! [nota de causa:: não acho que devamos discutir o CAESAR, pelo simples fato de que, na vida real, não existe ainda tal coisa. O que existe é o CAPTOR, e o RBE2, um PESA, lhe é superior, menos no que tange ao alcance. Mas este aspecto pode ser compensado por implementação tática de enlace de dados, visto que o radar francês pode receber e tratar informações vindas de outras fontes] Esqueceram, também, eu não sei se falam isso na íntegra, de dizer que o Typhoon em seu T1 é tão diferente do atual que não poderá ser modernizado!? Que modernidade é esta? Isso eu chamaria de aventura, pois o projeto é caquético! Falam em projeto moderno, mas e o conceito? O conceito moderno de se ter uma aeronave multimissão de fato!? O Typhoon nunca foi pensado assim, logo, hoje, acaba sofrendo na integração de armas ar-solo e sensores externos… Eles se “encaixam”, mas integrar à aeronave que seria o correto… Aparece bem em fotos com muitas GBLus, isso sim… [nota de causa:: suponho que o Francisco esteja falando do “Tranche 1”, uma primeira versão do Typhoon, biplace, que entrou em serviço no início do século 21 e agora está sendo preparada para modernização. Era basicamente uma plataforma de treinamento e adaptação, e não consegui maiores informações do que isso, mas acho que não foi essa a versão oferecida aos EAU, mas alguma coisa resultante da adaptação do “Tranche 2”, introduzido em 2006-2007, inicialmente a versão de superioridade aérea. Esta versão agora está sendo encaminhada para modernização, um programa chamado de “lote 5”. Dizem eles que terá características multimissão] O Rafale além de ser multipropósito é capaz de mudar de missão em pleno vôo, desde que carregue as armas adequadas, o Typhoon não! Comentaram sobre as AASMs? [nota de causa:: abreviatura de Armament Air-Sol Modulaire, ou “armamento modular ar-solo”, que, ao que se diz, foi testado com êxito na Líbia. É um tipo de míssil que é “montado” conforme o propósito da missão, em torno de uma bomba convencional] E sua atual capacidade de acertar alvos em movimento? [nota de causa:: a capacidade de identificar, selecionar e acertar alvos em movimento está ligada ao sistema GMTI/MMTI, integrado aos radares de abertura sintética. O CAPTOR é um radar deste tipo, e deve ter também essa capacidade. Mas sem dúvida, não tão eficiente quanto o RBE2, em função da capacidade superior dos radares padrão PESA em operarem mapeamento dinâmico de solo. Essa capacidade também está ligada a capacidade interna da aeronave em processar informações em tempo real, e não busquei comparações entre Rafale e Typhoon, neste aspecto. O que sei é que o computador central do Rafale é um monstro de 128 processadores] Outra coisa, se um caça tem disponível um míssil como o Meteor, por que pensar em AMRAM? O Meteor utiliza a tecnologia RAMJET, logo além de mais moderno, terá maior alcance efetivo [nota de causa::até onde sei, o Meteor, que ainda não está em serviço, é um produto da MBDA, e estará disponível para ambas as aeronaves] e o Mica IR, um míssil infravermelho com TVC capaz de alcançar 30/35km de NEZ… Qual AIM-9 tem esta capacidade? Sobre o SPECTRA, ele é bem mais do que você expôs… Na verdade só encontra um rival no F-35… Exercícios realizados nos EAU, dão conta de que o Rafale superou o Typhoon de tal maneira que os emires continuam insistindo no Rafale, esperneando pelo preço, mas não largam o osso… [nota de causa:: Neste aspecto, acho que os emires estão certíssimos, e espero que nossos negociadores, se é que existem, façam exatamente a mesma coisa::

Um rapaz (das Forças Especiais) às Terças:: Um rafalista real::

Um rafalista real...
Piloto de um Rafale F2 ocupa o cockpit da aeronave. Usa um capacete dotado de HMD (Head Mounted Display) Topsight Night. Diante dele, bem visível, o visor HUD (Head Up Display) tridimensional da aeronave.

E como não podia deixar de ser – tudo a ver com o Rafale. O rapaz aí em cima está sentado na cabine de um modelo do padrão F2, vestindo traje anti-G e portando o capacete equipado com HMD (Head Mounted Display) modelo Topsight, produto que começou a ser projetado em 1995, tendo em vista o Mirage 2000, pela empresa Sextant Avionique – atualmente integrada à Thales. O objetivo do sistema é aumentar a consciência situacional em curta distância, ou seja, para ambiências de combate aproximado ar-ar e ar-terra. O modelo mais avançado, o Topsight Night é um HMD binocular de terceira geração configurado para missões ar-ar e ar-solo noturnas, nos Rafale F2 e F3. Esse sistema processa imagens de uma câmera digital dupla com campo de visão de 40X30 graus, (aproximadamente o campo de visão humano) integrada ao FLIR (Flight InfraRed) e a intensificadores de imagem passivos. Pode ser usado tanto para manobrar esses sistemas quanto para apontar mísseis buscadores de calor. Seu peso, completo (capacete, máscara de oxigênio, comunicadores e sistemas integrados) é de 1800 gramas. O Topsight tem capacidade de comando de voz com até 150 entradas e som estéreo indicando a direção dos dados pelo som. Entretanto, esse sistema teve grandes problemas de desenvolvimento, e, é esperado, estará disponível para o upgrade F3 dos Rafale. Uma questão interessante é que a maioria dos pilotos afirma ser o Topsight Night extremamente desconfortável, e dizem preferir o Topsight E, modelo desenvolvido no final dos anos 1990 para o Mirage 2000C::

Rafale versus Typhoon::Como uma avaliação deve ser feita::

“Rafalista militante e juramentado” que sou, continuei pesquisando o tema na Internet, tendo agora como objetivo encontrar avaliações técnicas da aeronave, principalmente com relação às concorrências em que foi apresentada (e que perdeu todas). O que corre na imprensa especializada (imprensa da qual nossa intimorata “Veja” não faz parte), é que o problema do Rafale é mesmo o preço. Certo, isso parece mais do que confirmado, mas como o avião francês tem sido avaliado tecnicamente? É bom? É ruim? É uma “sucata”, como decidiram nosso Lord Rew-Rew e o gourmet boquirroto Antonio Ribeiro?

Falemos sério. Aeronaves tecnologicamente em “estado da arte” e caríssimas não são avaliadas por jornalistas especializados em insultos ou em restaurantes. A concorrência FX é um desses concursos – já falamos sobre ele aqui no causa:: Esses concursos são cheios de idas e vindas, e em nenhum está totalmente eliminada a possibilidade de um “por fora”. Ao contrário do que costuma a insinuar nossa imprensa, essas coisas não acontecem apenas no Brasil.

Dentre esses concursos, um dos maiores em que o Rafale foi apresentado é o Indian Air Force Medium Multi-Role Combat Aircraft, concorrência conhecida como MMRCA. É uma competição para a escolha de uma aeronave multifunção a ser fornecida para a Força Aérea Indiana (IAF – Indian Air Force) nos próximos dez anos, em números que alcançarão 126 unidades. Parte considerável dessas aeronaves deverá ser fabricada localmente, e o orçamento final do projeto chega a US$ 10 bilhões, ou seja – uma montanha de dinheiro. Iniciado em 2009, o concurso envolveu o Dassault Rafale, o Eurofighter Typhoon, o Boeing F/A18 Hornet, o JAS 39C Gripen NG, o MiG 29 e o Lockheed F16 Fighting Falcon. Em abril passado, foram escolhidos os dois finalistas: o Rafale e o Typhoon. As avaliações continuaram ao longo do ano, e o resultado deveria ter sido divulgado em este mês, mas informações vazadas do governo indiano dão conta de um possível adiamento da resposta. Parece que o problema é o preço das aeronaves selecionadas, que extrapola em muito o que as autoridades indianas estão dispostas a pagar. De toda forma, uma completa bateria de testes tanto técnicos quanto de campo, bem como questões sobre os termos do contrato a ser assinado foi (e ainda deve estar sendo) aplicada. Essa disputa tem gerado muita discussão na Internet, e acabei chegando ao fórum Indian Defense. Nesse fórum virtual encontrei um artigo bastante completo e mais de 500 páginas (é isso aí mesmo – quinhentas) de comentários, muitos deles altamente especializados, sobre os prós e contras das duas aeronaves. Não consegui identificar os autores (nesses espaços, todos os participantes adotam avatares meio ridículos), mas o crédito é deles, tanto do tal “major general jigjitnatt”, autor do artigo, quanto dos “coronéis”, “majores” e por aí vai: estão todos de parabéns. Seguindo o método habitual de causa::, recortei e editei parte do material (uma pequena parte – a edição de todo o material demoraria algumas semanas e resultaria em um livro sobre os dois caças…). A tradução (o original é em inglês) é livre, mas procura ser totalmente fiel ao conteúdo e pode ser verificada. Quando necessário, foi feita alguma pesquisa para esclarecer os termos técnicos, que são muitos – alguns já esclarecidos na postagem anterior. Depois de dois dias de trabalho, estou colocando o material à disposição dos assíduos do blogue das boas causas. Quem quiser ignorar e se aventurar pelo original, esteja à vontade (basta clicar ali em cima). No fim da leitura, terá se tornado um especialista em Rafale e em Typhoon, e poderá, com esse conhecimento, fazer muitas coisas legais – menos conseguir um emprego na “Veja” e uma bocada em Paris::

Agora é oficial: a longamente aguardada competição MMRCA chegou ao estágio final. Duas aeronaves foram selecionadas e deverão ir, cabeça com cabeça, até a vitória nessa competição de 10 bilhões de dólares. Os finalista são o Eurofighter Typhoon e o Dassault Rafale. Não posso prever qual será o vitorioso, mas posso dizer hoje qual dessas aeronaves a IAF deveria selecionar. Assim, sem maiores delongas, passarei à análise.

Aeroestrutura Ambas as aeronaves são configurações muito avançadas, em delta com canards. As duas já viram alguma ação e tem sido objetos de desejo de diversas forças aéreas, no mundo inteiro. Embora pareçam, à primeira vista, similares, as estruturas são completamente diferentes, e cada componente cumpre diferentes funções.

O Typhoon é uma aeronave de desenho formidável. Seus grandes canards estão posicionados em ângulo, com relação ao chão, logo atrás do nariz. Essa característica ajuda o conjunto a elevar rapidamente. Isto pelo fato de que cria uma “cauda virtual” que influencia fortemente o comportamento da aeronave, capacitando-a a apontar o nariz em qualquer direção muito rápido, de maneira semelhante ao que acontece no SU-30 MKI (o Flanker indiano).

Vale também à pena mencionar, no desenho do Typhoon, seu canopi. Tem o formato de bolha, com a vantagem de oferecer um amplo campo de visão ao piloto. As tomadas de ar dos motores estão situadas debaixo da fuselagem. Embora esse arranjo tenha vantagens, como melhorar o desempenho de vôos em baixas velocidades, também tende a criar problemas em situações de alta velocidade. Em curvas de alta velocidade, a estrutura sofre alta taxa de estresse, mas o desenho do Typhoon, indiscutivelmente bem resolvido, é muito robusto, sendo perfeitamente capaz de suportar tais cargas. O único problema observado são as exigências de manutenção que podem ser requeridas para manter a aeronave em boa forma.

Um dos pontos fortes é o desenho das asas, e logo ao primeiro exame, fica claro que o perfil limpo deve ter sido exigência dos britânicos, que requeriam uma máquina bem manobrável. Tudo nessa aeronave grita “velocidade” e “manobrabilidade”. O desenho das asas não é reto, mas ligeiramente curvados para cima, de modo a implementar a resistência e capacitar o conjunto a lidar melhor com baixas velocidades. Mesmo os slats são controlados por eixos giratórios motorizados, que requerem menos espaço nas asas e se movem mais rapidamente. A empenagem vertical tem um desenho convencional, pensado para ser resistente.

O Typhoon tem tomadas de ar de geometria variável, o que significa que podem ser diminuídas de modo a controlar o montante de admissão de ar para os motores. Esse detalhe é um dos diferenciais do modelo, pois pode tornar a aeronave mais eficiente em altas velocidades, tanto quanto nas baixas. Em aeronaves de desenho convencional, quando velocidades mais altas são requeridas, mais ar é admitido através das tomadas em função do desempenho aerodinâmico do conjunto. Torna-se mais difícil queimar essa quantidade extra de ar, de modo que mais combustível começa a ser gasto, o desempenho se torna menor e o motor começa a perder empuxo. No Typhoon, isso pode ser evitado através da redução do tamanho da tomada, que passa a admitir menos ar em altas velocidades, e quando o gás alcança a câmara de combustão, sua velocidade diminui, em função do grande volume daquela, de modo que a ignição é otimizada e o empuxo se mantém.

O Rafale é um pássaro diferente. Não é tão complexo, mas é robusto. Foi desenhado de modo que parece ao mesmo tempo bonito e resistente. Os canards do Rafale não são tão grandes quanto os do Typhoon, e estão posicionados muito próximos das asas, o que sugere que serão de pouca ajuda para o conjunto. Mas essa configuração implementa a eficácia aerodinâmica da aeronave. Pode ser uma diferencial notável, no que diz respeito ao vôo em baixas altitudes e altas velocidades. Nessas velocidades, essa configuração oferece menor resistência aerodinâmica e capacita a aeronave a atingir velocidades superiores a Mach 2.

O Rafale não tem uma concepção tão radical quanto a do Typhoon. A tecnologia utilizada em sua estrutura é mais convencional. Tudo nela já foi experimentado e testado. O projeto não foi concebido tendo em mente a mesma manobrabilidade que Typhoon. De fato, a aeronave multinacional é muito superior, em manobrabilidade e agilidade, à sua concorrente francesa. Os canards do Rafale, aparte o fato de proverem superfícies de controle adicionais, são posicionados de modo a assegurar que o fluxo de ar seja canalizado diretamente até o apex [nota de causa:: trata-se da área do bordo de ataque onde se concentra a carga dinâmica] do aerofólio [nota do causa:: outra maneira de dizer “asa”, quando se considera essa parte de uma aeronave do ponto de vista de seu comportamento aerodinâmico, ou seja, de como ela rompe a resistência do fluído, quer dizer, do ar (para os mortais não-engenheiros)], o que cria um efeito de vórtice [nota de causa:: trata-se de um movimento giratório e turbulento (um redemoinho) que, em certas condições, assume o fluxo de escape um fluído, e que é mais rápido no centro e decresce progressivamente conforme afasta-se do centro] que torna o conjunto muito mais estável em velocidades elevadas. Quanto mais próximos os canards das asas, menor é seu efeito. Para o Rafale, os canards atuam de modo muito similar aos slats. Os canards do Typhoon implementam a manobrabilidade da aeronave, mas não são muito eficazes, do ponto de vista aerodinâmico. O posicionamento dos canards escolhido para o Rafale proporciona à aeronave um padrão de curva melhor do que o do concorrente multinacional, quer dizer: o raio de curva do Typhoon é maior. Por outro lado, se estivermos considerando o efeito de implementar a elevação da aeronave, o Rafale perde. E os canards são feitos para isso, ajudar a aeronave a subir. O Rafale utiliza os canards para outras funções, que não têm relação com a manobrabilidade. Os canards do Rafale são feitos para lhe dar maior estabilidade.

A conclusão seria, então, que o Rafale não é tão manobrável quanto o Typhoon. Com carga similar ao concorrente francês, o multinacional curva num grau maior, em velocidades maiores. O menor empuxo do Rafale faz com que um loop vertical [nota de causa:: manobra em que a aeronave faz uma curva para cima de 360°, que se inicia num ponto e termina mais ou menos no mesmo ponto, na qual em alguns momentos a sustentação da aeronave é garantida pela potência dos motores] demore uma eternidade para se completar, quando em comparação com o Typhoon. E para padrões rápidos de curva, o Rafale também perde para seu concorrente. Os canards do Typhoon são desenhados para adicional arrasto quando usados, mas essa característica os torna muito eficazes. Eles são grandes e posicionados acima de modo a canalizar ar para as asas, e estas fazem o resto do trabalho. Em resumo: o Rafale pode transportar maior carga paga devido à sua estabilidade, mas o Typhoon ganha em manobrabilidade.

As tomadas de ar do Rafale também são convencionais. Elas tem um belo desenho, mas nada de revolucionário. Não são más, mas o Typhoon passa-lhe a frente também nesse detalhe. A aeronave multinacional tem uma taxa de aceleração muito melhor do que a do Rafale, e mesmo em situações em que a estabilidade faz a diferença, a aeronave francesa não consegue ultrapassar Mach 1.8. Em termos gerais, isto diz alguma coisa. O motivo são os propulsores.

MotoresO EJ200 [nota de causa:: O turbofan Eurojet EJ200 é o propulsor do Eurofighter Typhoon. É um produto baseado na tecnologia XG40, da empresa Rolls-Royce, desenvolvida durante a década de 1980, e posto em produção pelo consórcio Eurojet Turbo GmhB, instalada nas proximidades de Munique, Alemanha. As empresas líderes são a Rolls-Royce e a alemã MTU] é geralmente considerado superior ao Safran-Snecma M88-2 que equipa o Rafale, tanto em empuxo quanto em consumo de combustível.

O empuxo fornecido pelos propulsores EJ200 chega, em modo “seco” a 60 kN, podendo escalar até 90 kN em modo “molhado” [nota de causa:: em pós-combustão, modo utilizado em aeronaves militares para adquirir empuxo extra, em situações de decolagem ou de combate. O termo “molhado” (pouco usual no Brasil) é usado devido ao fato de que se consegue o empuxo adicional pela injeção de grande quantidade de combustível diretamente no exaustor da turbina (pós-combustor), o que provoca uma explosão controlada que aumenta a velocidade do conjunto]. Esses montantes são consideráveis e, juntamente com a forte aeroestrutura e as poderosas asas, os motores conseguem o máximo de seu desempenho. E o pessoal da Eurojet parece querer mais: correm notícias de que está para sair uma versão com TVC incorporado [nota de causa:: abreviatura de Thrust Vectoring Control – “controle de empuxo vetorado”. Se trata de uma forma de alterar a direção do jato de gás, num propulsor a jato ou a foguete, de modo alterar o ângulo de saída do fluxo]. Certamente isto é possível, mas, no momento, o EJ200 tem um desempenho não superado pelos concorrentes mais diretos, e o desempenho dos canards compensa, parcialmente, as vantagens que poderiam ser adicionadas pela inclusão do TVC.

O fato é que os propulsores são uma das mais fortes desvantagens do Rafale. A pergunta sobre o motivo da Dassault não ter posto um motor mais poderoso é simples: ele não precisa de um. O propulsor M88-2 instalado na aeronave francesa é muito bom, mas quando comparado aos das outras aeronaves da geração 4.5, o empuxo gerado por ele parece ser um tanto baixo. Não é que os propulsores da Snecma percam no quesito “empuxo seco”, onde alcançam 50 kN. O problema é no modo “molhado, onde a diferença sobe para 15 kN (75 a 90). Os testes parecem ter indicado que a eficiência dos dois produtos é a mesma, no modo pós combustão, resumindo-se o problema à potência . Já faz algum tempo a Dassault tem prometido apresentar um modelo da M88, o “3”, com maior empuxo, mas não se sabe o estágio de desenvolvimento desse novo propulsor. Apenas parece que será maior e mais potente que o modelo “2”.

No que diz respeito à potência combinada, em condições de serviço, o perfil de ambos é basicamente o mesmo: no Typhoon, o conjunto dispensa certa de 178 kN, bem mais dos que os 150 kN do Rafale. Se bem que tal diferença possa parecer considerável, ela conta muito pouco, já que o coeficiente peso-potência é quase o mesmo, no Rafale e no Typhoon. Quanto ao montante de carga bélica transportada, o Typhoon perde. O peso carregado do multinacional [nota de causa:: peso básico acrescido da capacidade interna de combustível] é de 16000 quilos, e o peso máximo da decolagem, de 23500 quilos, ou seja, o Typhoon transporta em torno de 7500 quilos de armamento, combustível externo e/ou pods especializados. Já o Rafale levanta, para um peso carregado de aproximadamente 14000 quilos, um peso máximo de 24500 quilos.

O Rafale é muito mais eficiente que o Typhoon, no que diz respeito ao consumo de combustível, mas o propulsor EJ200 conserva potência em altas velocidades Mach, dando ao Typhoon uma maior capacidade de aceleração, quando em velocidades superiores a Mach 1.5. A velocidade máxima do multinacional é de Mach 2 (uns 2490 km/h a 16000 ft), enquanto o Rafale, mesmo em condições ideais, dificilmente excede Mach 1.8 (aproximadamente 2130 km/h a 16000 ft). Alguns especialistas argumentam que o propulsor M88-2 tem melhor desempenho em altas altitudes e mantém o conjunto em velocidade supercruise [nota de causa:: velocidade de pelo menos Mach 1.1 (cerca de 1350 km/h) em condições de vôo normais (vôo estabilizado em altitude média), por mais de 20 minutos sem exceder o consumo  de combustível em mais de 40 por cento em relação ao vôo de cruzeiro] por mais tempo que o concorrente, mas essas vantagens não compensam a velocidade máxima, em condições de combate.
AviônicosO Typhoon monta, como principal equipamento, o radar CAPTOR [nota de causa:: produto do consórcio Euroradar, liderado pela empresa Selex Galileo, de Edimburgo. Foi desenvolvido com base no radar Blue Vixen, desenvolvido nos anos 1970 para o Sea Harrier FA2]. Trata-se de um radar multimodo Pulso-Doppler, com antena acionada mecanicamente. Não é novidade que essa tecnologia está, atualmente, ultrapasssada, podendo ser considerada uma geração atrasada com relação aos radares multimodulares do padrão PESA, e duas, com relação ao padrão AESA. Mas a Euroradar tem tentado melhorar o sistema, aumentando o tamanho da antena, o que lhe aumentou notavelmente a performance. O CAPTOR pode detetar aeronaves voando a uma distância de 160 km. Mas como se trata de um radar MSA [nota de causa:: abreviatura de Mechanically Steered Array, “equipamento mecanicamente dirigido”, aquelas antenas de radar que ficam se movendo em círculo ou em meio-círculo, acionadas por um motor, enquanto emitem o sinal], tem algumas desvantagens, a principal delas não poder rastrear muitos alvos ao mesmo tempo. Outra desvantagem considerável é a baixa capacidade de prevenir interferência eletrônica, ainda que o sistema apresente alguma capacidade de separação de pulsos. Ainda assim, no que diz respeito ao radar, o Rafale leva grande vantagem.

Graças ao Thales RBE2. Trata-se de um radar padrão PESA, cujo desempenho é influenciado negativamente pelo tamanho do nariz da aeronave francesa. Isso porque o tamanho do radar é restringido pelo espaço, o que limita a distância do rastreamento de alvos para algo em torno de 140-150 kms. Essa distância parece pequena, em relação aquela exibida pelo CAPTOR, mas a tecnologia do RBE2 é muito superior. Para começar, o sistema não tem peças móveis e é completamente automatizado. Quando em modo de interceptação, seleciona automaticamente as repetições de pulso de frequência, altas, médias e baixas, tornando mais clara a recepção. O RBE2 logo será substituído por outro, do padrão AESA, cujo alcance é estimado em 160-170 kms, e será ainda mais avançado, com relação ao antecessor. Não se pode dizer o mesmo em relação ao Typhoon, a não ser que notícias têm dado conta que um modelo do padrão AESA está sendo planejado, mas que não poderá ser incorporado ao “bloco 3’ da aeronave, embora talvez esteja disponível um upgrade.

Mesmo com o RBE2A, o alcance de rastreamento do Rafale será de menos de 200 kms. O padrão AESA não apresenta um ganho significativo com relação ao anterior PESA, em termos de alcance – de fato, a diferença é quase inexistente, não chegando a 10 ou 15 por cento. Portanto, a próxima versão do RBE2 será capaz de rastrear até 40 alvos ao mesmo tempo, à distâncias de até 160-170 km. Alguns especialistas argumentam que, com o limitado espaço de abertura disponível no Rafale, o RBE2A, mesmo com módulos de radar mais poderosos, apresentará limitações em missões de cobertura, SAR e busca e rastreamento. Por outro lado, o RBE2A mostrou-se invulnerável à interferência. Não restam dúvidas de que, tecnologicamente, o radar do Rafale é, até o momento, superior ao instalado no Typhoon.

O CAPTOR padrão AESA, ou CAESAR (CAPTOR AESA Radar), tem sido dito, deverá ser bem melhor do que o RBE2 padrão PESA. Especula-se que seu alcance será algo entre 200 e 220 kms. O CAESAR está sendo projetado para dar ao Typhoon um desempenho de função alternante dinâmica, de modo a poder cumprir funções de SAR, GMTI/MMTI [nota de causa:: abreviatura de Ground Moving Target Indicator/MultiMapping Targeting Indicator, ou seja “indicação de alvos terrestres móveis/indicação de alvos por mapeamento múltiplo”. Significa usar as capacidades dos radares de abertura sintética para produzir mapas de terreno em três dimensões, nos quais os marcos – edifícos, estradas, estruturas, veículos, aeronaves estacionadas, navios, antenas de rádio e de radar – são indicados nos mínimos detalhes, identificados em tempo real e precisamente localizados no terreno em torno da aeronave], busca/rasteamento aéreos, guerra eletrônica anti-míssil EW, e assim por diante. Diferente do Rafale, o Typhoon poderá cumprir muitas tarefas através de seu radar. Excetuando-se as funções de cobertura, SAR e busca/rastreamente, que ambas as aeronaves realizam, seus radares não tem muito em comum.

Isto parece significar que os projetistas do CAESAR estão desenhando seu produto para ser tecnologicamente superior ao radar da Thales. O projeto busca um desempenho similar ao do AN/APG79, que equipa o F/A18 Super Hornet, que, até o momento, é dado como mais capaz dentre os radares que equipam MRCAs (MultiRole Combat Aircraft, “aeronave de combate multimissão”).

Uma característica do radar do Typhoon, que parece ter sido copiada do AN/APG79 do F/A18 Super Hornet, e que é dada como uma vantagem é a abertura – 700 mm, enquanto a do Rafale é de 600 mm [nota de causa:: isto quer dizer que os módulos estado sólido que formam a “antena ativa” do radar projetam um “cone” de ondas cujo diâmetro inicial é de 70 cm, mais ou menos, e que se expande proporcionalmente. A 100 km de distância, esse “cone” cobre uma área de aproximadamente 70 km de raio, em todas as direções. Nos radares padrão AESA, essa abertura pode ser ampliada variando-se o ângulo de emissão de cada um dos módulos]. A antena do radar padrão AESA do Typhoon estará montada numa placa ajustável, ao invés de uma placa fixa, como no RBE2. Isto deverá dar ao CAESAR uma área de detecção maior do que a do concorrente francês.

Outra questão é que os projetistas do Rafale optaram por uma filosofia de utilizar softwares e pods especializados: o sistema SPECTRA, OSF (optrônicos), e pods para realizar tarefas de ECM (Eletronic Counter Measures, “contramedidas eletrônicas”), GMTI/MMTI, etc., enquanto o radar do Typhoon deverá ser capaz de fazer tudo isso. Por outro lado, os sistemas de contramedidas eletrônicas incorporados à aeronave têm se mostrado muito confiáveis, de modo que o Typhoon não precisa fiar-se exclusivamente em seu radar, pois tem um monte de sensores montados nele.

Entretanto, um argumento pode ser apontado como definitivo, com relação ao RBE2A: ele existe, enquanto o CAESAR, por enquanto, é uma promessa.

Um sistema do Rafale que merece ser mencionado é o SPECTRA. Trata-se de um software que aumenta as chances de sobrevivência da aeronave por automatizar várias de suas tarefas de autodefesa. O SPECTRA capacita integração e comunicações em rede com outras aeronaves e recursos em terra. Todos os elementos constitutivos do SPECTRA são construídos dentro da aeroestrutura, e tem alto nível de automação e integração. O SPECTRA inclui detectores de radar de laser e de infravermelho, possibilitando a prevenção da aproximação de mísseis. Elementos ativos incluem dispensadores de chaff e flare e interferência de rádio. O SPECTRA inclui funções de ELINT [nota de causa:: acrônimo de Electronic signaLs INTelligence, “inteligência de sinais eletrônicos”. Diz respeito à busca de sinais eletrônicos emitidos por sistemas que não de comunicações, com fins de inteligência, ou seja, de análise, localização, identificação e determinação de contramedidas] para gravação, análise e localização de emissões de ondas, de forma a identificar as possivelmente hostis. Tem sido dito que o SPECTRA também é capaz de potencializar as características stealthy da aeronave, visto incluir modos de interferência capazes de reduzir a assinatura de radar. Não se sabe como esse modo funciona, e nem se é realmente operacional. O fato é que a Thales e a MBDA tem testado um processo denominado “cancelamento ativo” que atuaria comparando e analisando sinais de radar e enviando cópias de volta à fonte emissora, com a fase modificada e, deste modo, alterando o eco de retorno.

Características de redução de seção rastreável por radarO Eurofighter Typhoon apresenta diversos elementos estruturais desenvolvidos de modo a reduzir a seção rastreável por radar (SRR) frontal da aeronave. Mas é somente a SRR frontal que é reduzida, pois, as SRR laterais são comparáveis às  de outras aeronaves modernas. É esperado que SRR frontal tenha medidas situadas entre 0.5 e 1 metro quadrado. Já o Rafale tem um SRR maior, devido, principalmente, ao menor uso de materiais compostos na estrutura. O formato da aeronave também é um problema, o que Cb por resultar em maior SRR lateral. A SRR da aeronave francesa deve subir a algo em torno de 1.5  até 2 metros quadrados.

Mas alguns analistas consideram ser totalmente inverídica a informação de que ambas as aeronaves têm SRR frontal de menos de 1 metro quadrado. Outros analistas vão além: afirmam que, apesar do amplo uso de materiais absorventes no Typhoon, o formato da estrutura da aeronave, com os grandes canards e tomadas de ar certamente resultam numa SRR frontal maior do que a do Rafale. Este tem, de acordo com esses especialistas, uma silhueta melhor desenhada. Por exemplo, as tomadas de ar funcionam melhor em ocultar a face do turbofan do rastreamento por radar do que as do Typhoon. A dispersão de ondas de radar, no Typhoon, permite melhores leituras ao longo do lado externo dos canards e das asas, mas o nariz, seção interna dos canards, raízes das asas, fuselagem e empenagem vertical são os grandes traidores. Mas levando em consideração que ambas as aeronaves, na vida real, voarão com mísseis montados e, possivelmente, também com tanques de combustível externos, não existe maneira de reduzir a assinatura de radar para leituras menores que 1 metro quadrado.

Deve-se levar em conta que ambas as aeronaves têm suas SRR otimizadas, mas não são, de fato, aeronaves stealth, não importa o que digam a Eurofighter e a Dassault. As assinaturas IR, em ambas, são grandes o suficiente para serem vistas a 90 km de distância, mesmo por adversários menos capazes. Não importa a quantidade e qualidade dos materiais absorventes de radar incorporados, nunca poderão ser comparadas aos caças quinta geração.

ArmamentoEste é um importante aspecto, em uma aeronave de caça. E ambos os modelos passaram a empregar, recentemente, novos mísseis. O Typhoon utiliza o Meteor, no futuro combinado ao ASRAAM [nota de causa:: abreviatura de Advanced Short Range Air to Air Missile, “míssil ar-ar avançado de curto alcance” produzido pelo consórcio MBDA para a Grã Bretanha, sob notação AIM132, orientado a calor. Entrou em serviço em 1998]; o Rafale deverá usar também o Meteor em combinação com o MICA. Todos esses mísseis são produtos “top de linha”, mas o que torna o Typhoon um sistema de armas superior é sua compatibilidade com os AIM9 Sidewinder e AIM120 AMRAAM [nota de causa:: abreviatura de Advanced Medium Range Air to Air Missile, “míssil ar-ar avançado de médio alcance”, um míssil de guiagem ativa, tipo “além do alcance visual” (BVR) com capacidade de operações noturnas e diurnas, em qualquer condição meteorológica. Substituiu o AIM7 Sparrow, ativo em todos os países da NATO]. Embora o MICA e o Meteor sejam mais do que capazes de lidar com esses mísseis, a questão é que o leque de opções à disposição do Rafale é mais estreito.

Ambas as aeronaves também são capazes de entregar munições ar-terra. Tem sido dito que o Typhoon não é uma plataforma ar-terra muito capaz, mas esta afirmação pode ser facilmente contestada. A aeronave multinacional é perfeitamente capaz de realizar qualquer tipo de missão dessa natureza. O problema é dar o treinamento adequado aos pilotos dessa aeronave. O número de pilotos qualificados para o Typhoon ainda é muito baixo, e todos eles são “caçadores puros”, não treinados para missões ar-terra.

Em resumo…O Rafale é uma grande aeronave, mas o Typhoon parece ser um pouco melhor. São ambas aeronaves muito caras e não se pode tomar uma decisão errada com nenhuma das duas. Se a decisão fosse deixada [aos cuidados do redator do texto], escolheria o Typhoon, sem nenhuma hesitação. O Rafale foi provado em serviço na Líbia, e claramente demonstrou o fato de que é um verdadeiro caça multimissão. The Typhoon foi empregado somente em missões de patrulha aérea, mas agora, ao que parece, juntou-se à campanha em outras missões.

Outra vantagem do Rafale é o fato de seu AESA estar pronto para entrega no próximo ano, enquanto o AESA do Typhoon não estará pronto antes de 2014 (a época em  que os primeiros jatos estarão sendo entregues à Força Aérea Indiana). Mas este se torna um dos principais argumentos para a escolha do produto Eurofighter, as oportunidades que vêm com ele. Podemos ter certeza que o Ministério da Defesa da Índia não deixará passar essa chance de ouro, participar ser parte do consórcio::